‘O Estado é um péssimo detentor de empresas’, diz presidente do BNDES

Já assumindo o “novo papel” que vislumbra para a instituição de fomento, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, estima que será possível levar a mercado as licitações de desestatização na área de saneamento em até 12 meses após a aprovação do novo marco regulatório do setor, hoje em discussão no Congresso Nacional. 

Sete Estados (Acre, Amapá, Pará, Ceará, Pernambuco, Alagoas e Rio) procuraram o banco para modelar projetos. Nesse novo papel, o BNDES será o “banco de serviços” dos governos das três esferas, elaborando projetos e coordenando privatizações de estatais, concessões e parcerias público-privadas. Montezano vê potencial para esse trabalho levar de “10 a 15 anos”.

Qual é o novo papel do BNDES?

O banco se tornou egocêntrico, no sentido de que assumiu a função de desembolsar recursos, liberar dinheiro para as empresas. Imagina ter trilhões de reais para desembolsar? Não é fácil desembolsar a quantidade de dinheiro que este banco desembolsou. Fiz isso a minha vida inteira e te digo: não é fácil. Porém, quando se faz isso com um dinheiro muito subsidiado, todo o Brasil faz fila na sua porta. O banco pede a maior quantidade de garantias possível que o cliente tem para disponibilizar e, como tem o crédito mais barato, a empresa vai dar. Então, fica girando essa máquina, pedindo garantias e desembolsando recursos. Na minha visão, e a turma mais antiga do banco repete isso, o banco esqueceu um pouco qual seu propósito final. O propósito deste banco é desenvolver o Brasil, transformar o nosso País, melhorar a vida das pessoas. O crédito é uma ferramenta para atingir esse propósito. O quanto o banco está fazendo de lucro numa operação é secundário.

O crédito não é importante?

O crédito é uma ferramenta e estamos adicionando outra, que é o serviço. As duas juntas são muito poderosas. No mundo de 20 anos para cá, o mercado de capitais se desenvolveu muito. O próprio Brasil se desenvolveu muito no mercado de capitais. Há instrumentos financeiros que antes não víamos. São US$ 15 trilhões em juros negativos (nos mercado globais), que é o número que circula hoje. Então, o diferencial não está no capital, na grana. O diferencial está na sua capacidade de entender os mercados e o cliente.

Como será isso na prática?

O grande gargalo nosso são bons projetos. O Estado brasileiro, ao longo dos anos, teve uma cultura de acumulador de bens e empresas. Foi abrindo empresas e acumulando bens. E a verdade é que o Estado é um péssimo detentor de empresas, um péssimo gestor de ativos. Os ativos na mão do Estado vão sendo degradados, vão perdendo valor e viram até passivos. Uma instituição que tem conhecimento, neutralidade e capacidade de contratar com o poder público agrega muito valor. Vai lá, pega aqueles ativos, transforma em projetos, desenvolve esses projetos e os coloca à disposição para o capital privado irrigar e administrar. Preparamos os ativos, pelo lado de (prestação de) serviços, e, no lado de crédito, conseguimos apoiar quem vai comprar o ativo. Temos o pacote completo: desenvolve e apoia. Acredito que este banco tem uma missão de 10 a 15 anos fazendo isso, porque a quantidade de ativos na mão do Estado brasileiro hoje é enorme. E o Estado não tem capacitação técnica, dinheiro, tempo nem gente para isso.

O BNDES vai atrás dos governos?

Primeiro, entramos no cliente “taylor made” (sob medida), que é o governo federal, nossa prioridade hoje. Queremos e vamos apoiar todo o processo de privatização e concessões do governo federal. A segunda camada de clientes são os Estados. São 27, é (um trabalho) mais pulverizado, pois eles têm menos capacitação de fazer leis, de pagar recursos. A última camada, que chamo de varejo, são os municípios. Temos de nos preparar mais para fazer isso, porque é mais massivo, não podemos errar. E tem eleição municipal ano que vem, o que nos dará um tempo para poder preparar esse portfólio.

Quais as prioridades este ano?

A prioridade zero é saneamento. Saneamento é um gargalo relevantíssimo para o Brasil. Nossos índices são vergonhosos, até para países em desenvolvimento. Temos um marco regulatório em curso agora (projeto de lei que muda as regras de concessão no setor, em discussão no Congresso Nacional), que vai fazer toda a diferença. Não falta dinheiro. Assim que tivermos esse ponto de partida (o novo marco regulatório), já temos alguns mandatos na casa de privatização em saneamento (sete Estados procuraram o BNDES). Com o novo marco, o mercado começa a se desenvolver e o capital flui. O nó é político.

O novo marco regulatório está em discussão desde o governo Michel Temer. Agora sai?

Estou otimista, até porque o Brasil precisa. Adoraria que o saneamento fosse a nova (reforma da) Previdência. Fomos para a rua pedir (a reforma da) Previdência (em protestos a favor do governo Jair Bolsonaro, em maio). Por que não vamos para a rua pedir saneamento?

Aprovado o novo marco, quando os projetos vão ao mercado?

Em menos de 12 meses. Está tudo pronto. É só apertar o botão. E o que a gente espera é que mais Estados e municípios venham na esteira.

Saque do FGTS deve ter pouco impacto sobre o PIB

Os benefícios para a economia brasileira com a liberação do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) devem ser de, no máximo, 0,30 ponto percentual neste ano e de 0,46 ponto percentual em 2020, segundo projeções feitas pela equipe econômica do Santander. 

O governo apontou, quando anunciou a medida, um impacto de 0,35 ponto percentual sobre o PIB (Produto Interno Bruto), sem separação por período.

Na sexta-feira passada, a Caixa depositou a seus clientes R$ 5,1 bilhões do dinheiro do FGTS, na segunda rodada de liberação de recursos. Não correntistas têm direito ao saque a partir de 18 de outubro, seguindo um cronograma que se estende até o final de março do próximo ano.

O cenário básico do banco aponta, porém, incremento mais modesto para a economia brasileira, que poderia crescer 0,20 ponto percentual em cada ano. Segundo Laiz Carvalho, da equipe econômica do banco, as estimativas consideram que todo o dinheiro retirado, até R$ 500 por conta, será usado para consumo.

Carvalho afirma ainda que a adesão ao saque aniversário, que deve ser autorizada no próximo ano, deve gerar ainda um aumento adicional de 0,20 ponto percentual ao ano no PIB. A projeção considera que 36% dos trabalhadores mudem o regime de acesso ao dinheiro do fundo, sacando parte dos recursos anualmente em vez da opção de retirada do montante em caso de demissão.

Nas projeções do Santander, se os valores sacados forem integralmente destinados a pagar dívidas, o impacto sobre o PIB é zero.

De acordo com a economista, o motivo é que a amortização de parte das dívidas não tem reflexo imediato sobre o consumo das famílias, ainda que exista um impacto positivo depois.

“Quando tem redução do comprometimento de renda, pode ter impacto depois no PIB. Mas o impacto primeiro é redução de endividamento e aumento confiança”, afirma.

Segundo dados de birôs de crédito, o país tem mais de 60 milhões de pessoas com o nome nos cadastros de devedores. Com os R$ 500 do saque, essas pessoas conseguiriam cobrir apenas 15% da dívida média.

Caso o dinheiro do FGTS vá para o pagamento de dívidas, a redução do comprometimento de renda pode ser de 0,15 ponto percentual neste e no próximo ano. Na projeção mais otimista, haveria uma redução de 0,25 ponto percentual em 2019 e de 0,40 no próximo ano.

País só terá sucesso se pacificar a política, diz controlador da MRV

O Brasil está esfacelado e não voltará a se desenvolver sem união política, afirma Rubens Menin, controlador de um dos maiores grupos empresariais brasileiros.

O problema, segundo ele, é que não há hoje político capaz de pacificação. “Quem hoje está lutando para conciliar o país? Não vejo ninguém.”

Para o empresário, que fundou há 40 anos a construtora MRV, a agenda econômica é insuficiente. “Não dá para crescer se a classe média ficar para trás, e igualdade de oportunidades é fundamental se quisermos ter uma nação.”

Na economia, ele diz que o impacto da queda dos juros está sendo subestimado, e considera a reforma administrativa e privatizações uma prioridade, porque será inútil mudar tributos sem cortar gastos. “O Estado tem que ser reduzido e ser supereficiente.”

Principal investidor da CNN Brasil, Menin afirma que se enganam os que afirmam que a emissora será “chapa-branca”: “Não defendo nem ataco o atual presidente”. 

Segundo ele, imprensa é “ferramenta de educação da sociedade” e o país precisa de “nacionalismo inteligente”: “Temos que gostar mais do Brasil”.

O empresário também falou sobre o que deve mudar na forma de as pessoas morarem e conviverem com os vizinhos.

A MRV fez 40 anos. O que espera dos próximos 10? 

Mais que do ponto de vista econômico, as empresas têm que ser instrumento de mudança social. O mundo passa por um desafio muito grande: houve crescimento, mas metade do mundo não cresceu. Isso não fica de pé. Acredito no capitalismo, mas temos que arrumar uma solução para isso.

Onde o capitalismo falhou?

Ainda é o melhor sistema, mas precisa evoluir. Um dos maiores problemas hoje é a “affordability” [ter um preço que permita que as pessoas comprem]. A classe média está cada vez mais comprometida com saúde, educação, lazer, internet… Vai ser uma das grandes discussões mundiais daqui para a frente, e o Brasil precisa entrar nela. 

O sr. escreveu recentemente em seu blog que, para se desenvolver, o Brasil precisa de união política.

Não tenho dúvida. É um dos problemas principais. O Brasil está todo esfacelado, e se não houver uma união nacional… 

Como fazer isso num país conflagrado?

Precisa de uma agenda mínima que atenda a todos, remar todos juntos para o mesmo lado. Um país não tem sucesso sem essa união. Sem uma agenda comum, justa, equilibrada, não vai… Não estou falando das minorias, mas de consenso e agenda nacional comum.

Na sua opinião o atual presidente trabalha para construir ou para demolir essa união?  

Com toda franqueza, não vou nem defender nem atacar o atual presidente. Qualquer presidente hoje no Brasil não conseguiria fazer isso. Divido a agenda política em duas partes. Uma coisa que me incomoda muito é brasileiro falando mal do Brasil lá fora. Todos perdemos. Temos que gostar mais do Brasil. Acho que o presidente enxerga isso, mas talvez não esteja conseguindo fazer. 

Refere-se aos pronunciamentos do presidente no exterior?  

Sim, o nacionalismo é importante. Nacionalismo inteligente, não o burro. Veja como os americanos cantam seu hino com muito mais fervor. Quem tem que gostar do Brasil somos nós. 

Outra coisa que a sociedade colocou de forma clara foi a corrupção. A corrupção no Brasil era muito maior do que a gente imaginava, foi surpresa para muita gente.

Foi surpresa para o sr.? 

Nesse nível, sim. Sabia que tinha, mas não nessa dimensão. Mas acho que vai acabar. Talvez não zerar, mas diminuir, porque a população não quer mais corrupção. Essa agenda está correta. 

Mas a agenda política precisa ser conciliatória, e o que me preocupa é que não estou vendo ninguém com uma agenda conciliatória. Quem hoje está lutando para conciliar o país? Não vejo ninguém. 

Não adianta fazer um Estado que tem 30% aqui, 40% aqui, mais tantas minorias. Não dá para ser consenso total, mas vamos tentar uma conciliação de uns 80% da população, isso tem que ser prioridade.

Rodrigo Maia [(DEM-RJ), presidente da Câmara] tem sido conciliatório?  

Hoje ninguém faria. Nenhum político no Brasil tem condições, as desavenças estão muito grandes. Não sou contra a política, até acho que ela melhorou. Entrou uma turma nova de deputados, as coisas não passam mais por baixo do tapete. E vai melhorar mais nas próximas eleições.

Por quê?  

A população não vai mais querer o jogo antigo. Acabou o ‘rouba, mas faz’. Você vê que sou mais otimista que a média [risos].

O sr. não tem atuação política direta, mas está no movimento Você Muda o Brasil e foi um dos grandes doadores de campanha.  

Com muito prazer, era a forma legal que havia de colocar pessoas boas, que passaram por um crivo, como os do movimento Renova.

Quais seus critérios para doar? 

Pessoas que conheço, que sei das qualidades pessoal, intelectual, ética, honestidade.

Mais que a agenda? 

Agenda também, mas não adianta ter agenda boa se é desonesto.

A agenda boa é liberal do ponto de vista da economia?  

Não só. O social também. O Brasil ideal é o Brasil da pacificação em que haja uma agenda econômica e uma agenda social.

Como social o sr. considera igualdade de oportunidade? Distribuição de renda?  

Tudo, tudo. Não adianta ficar ilhado. A discussão da Roundtable 200 [grupo dos maiores empresários americanos, que recentemente defendeu capitalismo com inclusão social] para mim é o estado da arte hoje. Não dá para crescer se a classe média ficar para trás, e igualdade de oportunidades é fundamental se quisermos ter uma nação.

Outro fator, no qual eu vinha sendo low profile, é a filantropia [ele integra o Bem Maior, que reúne empresários filantropos].  Nos EUA, eles doam 2% do PÌB, na Inglaterra 1,5%, no Brasil, 0,2%. É preciso devolver para a sociedade. Um dos problemas é que não há bons projetos para doar. Não adianta ter dinheiro sem gestão, projetos e gente. Se a gente conseguir mostrar resultado para a sociedade, isso vai funcionar, e o Brasil precisa muito disso. Não podemos estar neste mundo a passeio.

O Luciano Huck, que faz parte também do Bem Maior, tem se apresentado…

O Luciano está agora com um viés político. A gente não tem viés político. Se for para a política partidária, vou perder minha liberdade.

Huck não tem feito política partidária.  

Estou falando de mim. Mas o Bem Maior não pode ter conotação partidária. Não me manifesto de forma partidária nem denegrindo a imagem de ninguém, porque aí vai contra tudo o que penso.

O sr. é apontado como defensor do presidente Jair Bolsonaro.  

É só me mostrar onde. Nunca defendi nem ele nem ninguém. As pessoas são gozadas. Falam que a CNN vai ser uma TV chapa-branca… Procuro me policiar muito nisso. Às vezes é importante falar do que é bom. Mas daí a ficar enaltecendo muito as coisas, não quero, não.

O investimento na CNN não deixa também de ser uma atuação política. Por que investir em TV?  

Não é TV; vamos chamar de imprensa? Imprensa é uma ferramenta de educação da sociedade. Precisa se reinventar e investir em gente. Voltar a ter um papel de mais destaque e credibilidade na população, se quiser fazer esse papel de pacificação da sociedade, de união. E a gente não leva as coisas boas do Brasil para o mundo. Se a gente não levar, o mundo não vai querer vir para o Brasil.

Em 2018 o sr. disse que o ano tinha sido frustrante, mas estava otimista para 2019. Já reviu?  

Com certeza este não vai ser aquele ano para o qual torcíamos. Mas há algo muito importante: ninguém previa que os juros iam cair tanto. No mundo, a política monetária afeta cada vez menos a atividade econômica, mas no Brasil vai ser muito mais forte. Os analistas econômicos não estão prevendo de forma acurada essa potencial de crescimento do meu setor. Uma queda de dois pontos percentuais nos juros bota muita gente no jogo.

Quanta gente?  

Surge no Brasil 1,4 milhão de novas famílias por ano, e só 600 mil tem condições de comprar casa própria. Com os juros no novo patamar, vamos inserir mais 500 mil famílias. Se o PIB subir mais de 1% neste ano não me surpreenderá. 

As reformas recentes do país melhoraram o ambiente de negócios? 

Visito muitos investidores mundo afora, e, por incrível que pareça, o ambiente regulatório e institucional do Brasil é visto como o melhor entre os Brics [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul].

O que eles estão esperando para vir? 

A melhoria econômica. Há cinco pontos cruciais para isso, e um alinhamento da sociedade com eles, como no caso da Previdência e da reforma trabalhista, que ainda está acontecendo. O terceiro é a reforma administrativa, talvez a mais importante.

Mais que a tributária?  

A tributária é fundamental, mas muito complexa. Não sai neste ano. Deixa eu falar antes do quinto ponto, a privatização. Se não diminuir o tamanho do Estado, não adianta fazer reforma tributária, porque continua gastando e precisa arrecadar. O Estado tem que ser reduzido e super eficiente. 

Se fizer esse arcabouço completo, dará competitividade muito maior ao Brasil. Só há três países no mundo com dimensões continentais e mais de 200 milhões de habitantes: EUA, China e Brasil, que tem muito mais infraestrutura para ser feita, mais campo, mais mineração. Temos que aproveitar esse potencial. 

Mas não cabe ficar colocando a culpa nos outros, é a gente que tem que fazer.

Os índices de expectativa de empresários e do setor de construção…

Estão muito ruins.

E o “índice Rubens” de confiança?  

Está batendo lá em cima. Mas há grandes desafios.

Seu otimismo também se estende ao Atlético-MG?  

Sim, mas com o pé no chão. O Brasil nunca vai ter 20 times grandes, vai ter 5 ou 6, e queremos ser um deles. Se a gente fizer uma administração muito boa, dá para chegar lá.

Quando fica pronta a Arena MRV [a família Menin doou um terreno para a construção de um estádio do Atlético-MG]?

Se tudo der certo começa neste ano. Acreditamos que dá para construir em 24 meses.

Delatores da Lava-Jato devolveram R$ 1,8 bilhão aos cofres públicos

Cinco anos e meio após a Lava-Jato desbaratar o maior esquema de corrupção já registrado no país, quase 60% do dinheiro que delatores prometeram devolver já entrou nos cofres públicos no Rio e no Paraná. De acordo com levantamento feito pelo GLOBO, cerca de 221 delatores ressarciram R$ 1,837 bilhão de um total de R$ 3,1 bilhões. Não foram levados em consideração os valores pagos por empresas em acordos de leniência com as forças-tarefas dos estados.

Na semana passada, parentes de Dario Messer, apontado como o doleiro dos doleiros, depositaram na Justiça do Rio o equivalente a US$ 7 milhões. É a última parcela do acordo fechado pela família. Os três filhos Dan, Débora e Denise, além de Rosane, ex-mulher de Messer, devolveram, em dinheiro, um total de R$ 270 milhões, recursos que estavam escondidos em contas bancárias abertas fora do Brasil. Outros R$ 100 milhões estão bloqueados em bens como apartamentos na Zona Sul do Rio de Janeiro, joias e 10 quadros do artista Di Cavalcanti.

Messer segue preso em Bangu 8, onde não descarta a possibilidade de uma delação. Em décadas de atuação, o doleiro se aproximou de empresários, atletas e políticos, inclusive no exterior. Ele era muito amigo, por exemplo, do ex-presidente do Paraguai Horácio Cartes.

Quando o assunto é a devolução de dinheiro aos cofres públicos, a família Messer já é a recordista na Lava-Jato. O levantamento realizado pelo GLOBO aponta que, em segundo lugar no ranking, aparece Eduardo Plass, que ficou conhecido por lavar dinheiro de joias do ex-governador Sergio Cabral e por se tornar um dos principais delatores do empresário Eike Batista.

A família Messer, Plass e o ex-gerente de Engenharia da Diretoria de Serviços da Petrobras Pedro Barusco fazem parte de um seleto grupo de 10 delatores que, ao final do pagamento de suas dívidas com a Justiça, terão devolvido o equivalente a R$ 1, 4 bilhão. Também estão no topo da lista o lobista Julio Faerman, o ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, os empreiteiros Marcelo e Emílio e Odebrecht e o doleiro Alberto Youssef. Embora alguns deles ainda não tenham quitado os valores devidos, todos já saíram da cadeia.

Conhecido como o “delator de US$ 100 milhões”, Barusco levava à época dos desvios um altíssimo padrão de vida, que incluía uma adega com garrafas de vinho que chegavam a custar US$ 10 mil. Em 2015, o ex-gerente foi o primeiro a devolver um montante significativo: R$ 199 milhões. Em sua delação, afirmou que recebeu US$ 100 milhões em propina de empreiteiras.

No caso dos ex-funcionários da Petrobras, é possível aferir o quão incompatíveis são essas cifras em comparação aos rendimentos recebidos à época em que trabalhavam na estatal. Segundo o próprio Pedro Barusco declarou, durante sessão da CPI da Petrobras, em 2016, seu salário rendia, por ano, em torno de R$ 1, 2 milhão. Se mantivesse esse rendimento, levaria exatos 165 anos e nove meses para acumular os R$ 199 milhões que se viu obrigado a devolver.

Duque, o arrependido

Há mais de um ano, Barusco vive sem tornozeleira eletrônica. Enquanto isso, seu ex-chefe Renato Duque, ex-diretor de serviços da estatal, ainda está preso na carceragem da Polícia Federal de Curitiba. Em março de 2015, a Polícia Federal encontrou 131 obras de arte na cobertura duplex de Duque, na Barra da Tijuca.

O patrimônio chamou atenção e levou ao rastreamento de R$ 77 milhões em suas contas no exterior. Duque, inicialmente, permaneceu calado. Quando cogitou fazer delação, já era tarde.

Em depoimento à Justiça, na semana passada, ele disse que se arrependeu de “ter permanecido calado”. Em julho de 2017, Duque decidiu abrir mão dos valores descobertos no exterior pela Lava-Jato, segundo dizem seus advogados.

A devolução foi uma das contrapartidas para um acerto que lhe permitirá sair da cadeia após cumprir cinco anos (ele já cumpriu quatro anos e meio). O ex-diretor recebia cerca de R$ 2, 2 milhões anuais, em salário fixado em 2011, valor máximo que a estatal pagava para o cargo na época.

Dinheiro para pagar o 13º

Para o procurador regional da República José Augusto Vagos, que atua na força-tarefa do Rio, a recuperação de valores é complexa. E era ainda mais difícil antes da Lava-Jato. No escândalo de corrupção descoberto na Secretaria Fazenda do Rio, em 2002, por exemplo, não houve sucesso na recuperação de dinheiro.

— Os valores recuperados pelas colaborações premiadas sequer têm paralelo de comparação com outros processos criminais que nunca chegam ao fim no Brasil — disse Vagos.

Aos poucos, os valores devolvidos deixam a esfera do Judiciário e vêm sendo usados pelo poder público. Pelo menos R$ 250 milhões recuperados no Rio foram liberados para pagar o décimo terceiro atrasado de 146 mil aposentados e pensionistas do estado. No Paraná, pelo menos R$ 892 milhões pagos por parte dos delatores já retornaram à Petrobras.

Integrantes das forças-tarefas estimam que os valores devolvidos até agora alcançam um patamar razoável. Há ainda uma parte que foi parcelada para que os delatores tenham condições de se desfazer de patrimônio adquirido de forma ilegal.

Se não houver calote, esses pagamentos continuarão chegando aos cofres públicos ao longo dos próximos anos. Há ainda valores não contabilizados publicamente porque as informações sobre as colaborações são mantidas sob sigilo.


Governo do Estado confirma privatização da Cedae e fim das obras da Linha 4 em 2020

Um dia depois de o governo anunciar as medidas apresentadas para tentar revisar o Regimento de Recuperação Fiscal do Rio, o governador Wilson Witzel anunciou, nesta sexta-feira, que a privatização da Cedae acontecerá até o outubro do ano que vem. Segundo ele, a privatização depende do marco regulatório do saneamento, que ainda não foi votado na Câmara dos Deputados. A companhia é a contrapartida de um empréstimo, tomado em 2017, do Estado com o Banco BNP Paribas, de R$2,9 bilhões, principal medida da recuperação fiscal.

— Estamos caminhando a passos largos com a privatização da Cedae, aguardando agora o marco regulatório do Saneamento na Câmara dos Deputados, que era para ser votado em agosto, ficou para setembro e agora está ficando para outubo. Mas pedi ao Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados) celeridade ao processo de votação, porque, ao privatizarmos a concessão de saneamento da Cedae, teremos em três anos, na Região Metropolitana, R$ 10 bilhões em obras para saneamento, resolvendo definitivamente o problema da poluição das baías, especialmente da Guanabara — disse o governador, acrescentando a possibilidade de realizar também o IPO (Oferta Pública Inicial) da Cedae “para torná-la cada vez mais competitiva, transparente e eficiente”.

Linha 4 do metrô em 2020

O governador também afirmou que vai retomar a construção das obras da estação de metrô da Gávea e finalizar a Linha 4 até o ano que vem. Wilson Witzel explicou que será possível reiniciar as obras com a verba que será transferida ao estado a partir das contas dos delatores na Operação Lava-Jato, conforme determinação do Ministério Público Federal.

— Nós vamos obter cerca de R$ 350 milhões imediatamente e, assim, iniciaremos as obras da Linha 4 para finalizar a estação da Gávea. Ainda falta outros R$ 400 milhões ou R$ 600 milhões, mas nós também vamos receber cerca de R$ 2,5 bilhões do megaleilão do petróleo — ressaltou ele, que na semana que vem vai conversar com engenheiros e a Secretaria de Infraestrutura para viabilizar o cronograma.

Alíquota de ICMS alterada para produtos importados

Witzel discursou nesta tarde no Palácio Guanabara, onde assinou um decreto que altera a alíquota de ICMS de produtos importados. O “Rio Importa +” altera regras de tributação de produtos importados para a indústria e comércio que chegarem pelos portos e aeroportos do Rio. O decreto, que vai regulamentar o programa, determina que o ICMS sobre produtos importados deixa de ser cobrado na chegada ao país, passando a ser pago posteriormente, no momento da venda. A expectativa é de movimentar diversos setores da cadeia produtiva, desde os portos e aeroportos até o transporte dos produtos para outros estados pelas rodovias.

De acordo com o secretário de Fazenda, Luiz Claudio de Carvalho, o decreto acarretará maior impacto na economia do estado, especialmente porque será possível fazer do Rio um polo de distribuição de mercadorias importadas.

— Não é um benefício fiscal do ponto de vista de redução de carga (tributária). Estamos num regime de recuperação fiscal e não podemos abrir mão de receita, muito pelo contrário. Com o aumento da atividade econômica, temos a convicção de que a receita tributária também aumentará e, ao aumentar a receita vinda pelo crescimento econômico, a gente busca o reequilíbrio fiscal do estado — explicou o secretário de Fazenda, Luiz Claudio de Carvalho.

Witzel quer fechamento de fronteiras com Bolívia, Colômbia e Paraguai para conter tráfico de drogas e armas

Wilson Witzel afirmou neste domingo que pretende pedir a ajuda dos países do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) para conter o comércio ilegal de armas e drogas por traficantes nas favelas do estado. O governador levantou, inclusive, a possibilidade de fechamento das fronteiras do Brasil com Bolívia, Colômbia e Paraguai, algo que só pode ser determinado pelo governo federal.

– O próprio conselho pode tomar essa decisão: retaliar Paraguai, Bolívia e Colômbia, no que diz respeito às armas. Países que vendem armas para esses países têm que ser proibidos de fazê-lo, sob pena de continuar esse massacre, essa situação sangrenta que vivemos nas comunidades do Rio – disse o governador.

Witzel usou a palavra “genocídio” para classificar o quadro de violência nas favelas do estado e relatou ter pedido ajuda do ministro da justiça Sergio Moro para enfrentar a situação:

– Tentei, através do Ministério da Justiça, que o Moro viesse comigo. Se não vier, nós vamos sozinhos, porque o Rio de Janeiro vai fazer o seu trabalho junto à ONU. Já pedi para entrarem em contato com o Conselho de Segurança da ONU para que eu possa expor o que está acontecendo no Rio e pedir providências junto a esses países.

As declarações de Witzel podem ser lidas como mais um movimento do governador no seu esforço para se posicionar como um candidato competitivo para as eleições presidenciais de 2022. Uma pesquisa feita pela consultoria Qaest atestou que, em agosto, ele superou governadores como Doria e Ronaldo Caiado (DEM), de Goiás, em relevância nas redes sociais.

Em outubro, Witzel pretende ir a São Paulo para abrir contato com agentes de segurança locais. O tema é tratado como o grande carro-chefe do seu governo. Além da retórica beligerante (já falou em jogar um míssil na Cidade de Deus) e do aumento das operações policiais em favelas, Witzel tem colocado todas as fichas no programa Segurança Presente, de incremento do policiamento em bairros da capital.

Nos próximos meses, Witzel vai tentar modular o discurso e mostrar que seu governo não se resume a ações na segurança pública. A primeira meta é reforçar o seu lado social. Lançará o programa Comunidade Cidade, uma espécie de Favela-Bairro ou Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do seu governo com investimentos de mais de R$ 2 bilhões que começarão pela Rocinha.

Prefeitura estuda abrir brecha para liberação de novos apart-hotéis

A prefeitura estuda a ideia de licenciar apart-hotéis com regras bem mais flexíveis que as presentes na atual legislação urbanística do município. Oficialmente, o Executivo tem como meta permitir uma mudança no uso de hotéis que, construídos para a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 , fecharam as portas ou sofrem com a baixa ocupação. Especialistas ouvidos pelo GLOBO, no entanto, observam que, se for aprovado, o projeto não só permitirá que esses empreendimentos virem residenciais como dará margem para que qualquer hotel ou motel, independentemente da data de inauguração, ganhe outro perfil.

Os empreendimentos não teriam que respeitar as regras de gabarito e de oferta de vagas na garagem. Embora varie conforme a região, a legislação que disciplina a construção de hotéis é mais liberal que a referente aos imóveis residenciais — o gabarito, no primeiro caso, quase sempre é maior do que o permitido no bairro. A ideia foi apresentada em reuniões recentes do Conselho Municipal de Políticas Urbanas (Compur), órgão da prefeitura que conta com integrantes da sociedade civil. Técnicos da Secretaria de Urbanismo já apresentaram ao Compur duas minutas de projetos, que precisam ser aprovados pela Câmara Municipal.

Nos documentos, a palavra “apart-hotel” não é mencionada. Porém, segundo o projeto, a transformação dos imóveis é possível, e seria autorizada desde que o proprietário concordasse em pagar uma espécie de taxa de regularização. A prefeitura calcularia o valor de acordo com as dimensões do prédio, caso o empreendimento tenha gabarito superior ao autorizado para a região.

— Essa proposta pode fazer surgir apartamentos com área inferior a 25 metros quadrados, o mínimo permitido pelo Código de Obras aprovado no atual governo — observou a arquiteta Rose Compans, consultora de urbanismo da Federação das Associações de Moradores do Rio (FAM-Rio).

As minutas ainda preveem que um hotel pode virar um prédio comercial ou ter uso misto: uma parte do imóvel continuaria com quartos para hóspedes; a outra ficaria com unidades residenciais.

RISCO DE ADENSAMENTO

Representante da FAM-Rio no Compur e ex-procuradora-geral do município, Sônia Rabello disse que a prefeitura não foi transparente em relação ao impacto da proposta para a cidade:

— Os fundamentos são os mesmos da “lei dos aparts”, mas a prefeitura não apresentou relatórios que indiquem quais imóveis têm interesse de mudar de uso. Também não abordou o impacto que isso traria para a região, incluindo a diferença de gabarito.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Hoteleira (ABIH-RJ), Alfredo Lopes, disse que não partiu da entidade a iniciativa de propor a mudança. Segundo ele, redes tradicionais do setor não têm vontade de alterar o perfil de seus negócios. Lopes acrescentou que o interesse em mudar a lei seria principalmente de construtoras “que decidiram investir em hotéis financiados por um mecanismo apelidado de ‘condomínio-hotel’: empreendimentos viabilizados com vários sócios, que compram cotas para investimento. Ele ressalta que o Rio precisa é de um calendário sustentável de eventos, que garanta a ocupação da rede hoteleira o ano inteiro. Além disso, sugere que sejam cobrados impostos de aplicativos de hospedagem (como o Airbnb).

— Em junho de 2018, a taxa de ocupação dos hotéis chegou ao seu pior índice, 46% — contou Lopes. — Permitir a transformação dos prédios em aparts pode adensar os bairros e prejudicar até mesmo o setor hoteleiro.

O mercado já se movimenta na expectativa de mudança. Dono da incorporadora Bait, Carlos Henrique Blecher disse que tem sondado proprietários de hotéis para convertê-los em residenciais com serviços. Ele argumenta que o cenário atual é favorável aos aparts.

— A demanda do mercado é por unidades menores, mas com oferta de serviços de qualidade. A questão do adensamento é discutivel. Nova York, Paris e Londres são bem mais adensadas que o Rio — ponderou Blecher.

QUINZE FECHARAM

Em nota, a prefeitura confirmou que estuda mudanças na legislação hoteleira. Questionada sobre o impacto urbanístico de uma eventual conversão de hotéis com gabarito muito acima do permitido em áreas residenciais, frisou que os estudos estão em desenvolvimento. “O foco da proposta não foi apenas a transformação de uso. Um dos principais objetivos seria permitir a finalização do processo de licenciamento das obras dos hotéis não concluídos (sem “habite-se” ou aceitação das obras) e a possibilidade de subsistência desta atividade econômica”, afirma o município, sem prever quando o texto vai para a análise de vereadores.

Em 2010, incentivos foram concedidos para atender a uma demanda do Comitê Olímpico Internacional (COI). A instituição exigia que pelo menos 7 mil quartos extras fossem abertos, mas a prefeitura do Rio acabou licenciando 94 projetos com um total de 16.780 unidades — 13 hotéis não chegaram a sair do papel. Na época, o município autorizou edificações até mesmo em ruas de bairros em que não eram mais permitidos empreendimentos hoteleiros, como Flamengo, Copacabana, Guaratiba, Realengo, Barra, Itanhangá, Jacarepaguá, Joá e São Conrado. Desde 2016, porém, 15 hotéis fecharam as portas na cidade, incluindo o Mercure Barra e o Ibis Porto Atlântico, no Centro.

JUSTIÇA DERRUBOU PROJETO ANTERIOR

– Projetos de apart-hotel são motivo de controvérsia na cidade. Em 2002, a Justiça julgou inconstitucional a Lei 41/1999, de iniciativa do então prefeito Luiz Paulo Conde, que disciplinava a construção dos aparts. Um dos pontos que levou ao resultado desfavorável foi o fato de esses projetos não respeitarem as normas urbanísticas em vigor nos bairros, provocando adensamento e problemas no trânsito.

– Na época, havia uma espécie de febre por esse tipo de projeto e muitos foram construídos em ruas internas da Zona Sul e da Barra. Pela legislação atual, só são permitidos novos aparts no Centro e na Zona Portuária, em uma tentativa de estimular o uso residencial nessas regiões.

– Pela proposta em discussão na prefeitura, até projetos que foram embargados porque os responsáveis construíram andares acima do permitido deveriam ser legalizados. Entre os empreendimentos que podem receber autorização para virar aparts estão os tradicionais hotéis Nacional e Intercontinental, em São Conrado. Eles são citados na segunda proposta apresentada no Compur, na quinta-feira passada, que trata de iniciativas para estimular a ocupação de imóveis tombados. Ao mencionar os hotéis, técnicos da prefeitura explicaram que a ideia é permitir a subdivisão das edificações “em unidades hoteleiras ou unidades residenciais independentes”.

– Com suítes que medem de 33 a 99 metros quadrados (fora a presidencial, que tem 231), o Nacional, projetado por Oscar Niemeyer, reabriu na semana passada. Fechou em 1995, depois da falência do Grupo Interunion, e reabriu em 2016, por apenas 15 meses. Os atuais donos informaram que o interesse é manter o imóvel como hotel.


Novas modalidades de investimento em imóveis atraem o pequeno poupador

Reza a lenda que os imóveis estão entre os investimentos preferidos no país. “Brasileiro gosta de investir em tijolo”, você já deve ter ouvido algo nesse gênero, não? Apostando nisso, fintechs, as startups de serviços financeiros, têm conquistado pessoas físicas para emprestar dinheiro a construtoras, com a promessa de retornos atrativos. São os chamados investimentos coletivos no setor imobiliário.

O modelo ainda é incomum, mas cresce. Foi inaugurado em 2015 pela Urbe.me, plataforma que concentra o maior volume de captações, pela qual 30 empreendimentos imobiliários captaram R$ 49 milhões até o momento. Desde então, outras fintechs se especializaram nesse tipo de investimento, como a Expeer, a Glebba e a Cap.rate.

Essas empresas são reguladas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ou pelo Banco Central (BC), conforme o modelo em que são estruturadas: via “crowdfunding” — espécie de vaquinha virtual, regulada pela CVM — ou “peer to peer” — empréstimo entre pessoas, regulado pelo BC.

Ambos os tipos de plataforma conectam investidores em busca de diversificação de carteiras a incorporadoras que precisam de recursos para financiar seus projetos.

As fintechs vieram para suprir uma demanda das construtoras: falta dinheiro no caixa para começar as obras. Para muitas empresas, estruturar títulos de dívidas como debêntures e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) custa caro e conseguir financiamento no banco é difícil no início das construções, quando os empreendimentos ainda não foram vendidos.

As plataformas se difundem diante da perspectiva de que o setor imobiliário vai entrar em um novo ciclo de crescimento. Apesar do desempenho frustrante da economia, os estoques das incorporadoras dão sinais de melhora e os lançamentos vêm sendo retomados, o que leva as empresas a buscar mais recursos.

Do outro lado, em um ambiente de taxa básica de juros, a Selic, na mínima histórica, existe uma demanda de pequenos investidores por investimentos de maior risco, que deem retornos mais altos. Os investimentos coletivos no setor imobiliário são mais uma alternativa de aplicação financeira para quem gosta de investir em imóveis e está disposto a encarar risco para, quem sabe, colher os frutos.

“Queremos democratizar o investimento em imóveis e torná-lo acessível aos pequenos e médios investidores, que não têm grandes fortunas”, diz Danilo Ribeiro, sócio-fundador da Expeer.

Com a partir de R$ 1.000, é possível investir em condomínios residenciais, empreendimentos comerciais e até bairros planejados. Os retornos podem ser consideravelmente acima da Selic, atualmente em 5,5% ao ano. Os investidores da primeira rodada de crowdfunding imobiliário liquidada no Brasil, no mês passado, pela Urbe.me, tiveram retorno de 18,7% ao ano.

Além do retorno atrativo, o investimento coletivo em imóveis permite ao pequeno investidor participar de um mercado que antes era mais restrito. No formato tradicional de investimento em incorporação imobiliária, o investimento mínimo é alto e o investidor precisa ter uma relação próxima com o incorporador, o que impede que os pequenos participem diretamente desse mercado.

O investimento coletivo em imóveis é diferente de um fundo imobiliário porque, no crowdfunding ou peer to peer imobiliário, o investidor aplica diretamente em um único empreendimento e pode optar por um em seu bairro ou em sua cidade, com o qual se identifica. Já em um fundo imobiliário, um gestor escolhe vários empreendimentos para investir para os cotistas.

Vale a pena investir?

Não é à toa que os retornos oferecidos são atrativos. É uma forma das incorporadoras compensarem pelo risco da aplicação.

As próprias fintechs deixam claro que não querem que o investidor aloque todo o seu patrimônio nesse tipo de investimento, já que corre o risco de perder tudo. Elas recomendam investir, no máximo, 20% do patrimônio, conforme o perfil de risco do investidor.

Para especialistas em finanças, o investimento pode servir como forma de diversificação da carteira, especialmente para quem é entusiasta de fintechs e de novos investimentos. No entanto, fundos imobiliários podem ser mais atrativos.

“Esse tipo de investimento é mais arriscado do que fundo imobiliário e tem menos liquidez para o investidor sair na hora que quiser”, observa Gustavo Cunha, planejador financeiro e professor de finanças.

Além disso, os fundos imobiliários têm três vantagens competitivas importantes: possibilitam diversificar os empreendimentos investidos, distribuem rendimentos periodicamente aos investidores e são isentos de Imposto de Renda.

No modelo de “crowdfunding” imobiliário, o investimento é considerado um empréstimo para a incorporadora. Assim sendo, o imposto é retido diretamente na fonte, ou seja, o recolhimento do imposto é de responsabilidade da incorporadora.

Já no modelo de “peer to peer” imobiliário, o seu investimento é tributado da mesma maneira que um CDB. Desta forma, a alíquota — que varia de 15% a 22%, conforme o prazo — é descontada diretamente em fonte e incide apenas sobre o ganho de capital.

“Esses novos investimentos em imóveis são para os investidores que aceitam o maior risco de todos e que não estão em busca de renda periódica”, alerta Arthur Vieira de Moraes, especialista em fundos imobiliários e professor de finanças.

Vale lembrar que os fundos imobiliários estão em alta. Eles atingiram a marca de 1 milhão de investidores no 1º semestre deste ano e encontraram um cenário fértil para crescimento. Em um cenário de juros baixos, investidores estão correndo para os imóveis para diversificar sua carteira.

Governo deve lançar programa com leasing de imóveis para classes C e D

O presidente Jair Bolsonaro deve lançar em breve um novo programa habitacional, batizado de Aproxima, pelo qual vai oferecer um terreno para que construtoras ergam empreendimentos prevendo imóveis residenciais e estabelecimentos comerciais.

Será destinado a famílias com renda entre dois e cinco salários mínimos (hoje, de R$ 1.996 a R$ 4.990), classes C e D. A ideia é fazer uma espécie de leasing: o morador que pagar aluguel até o fim do contrato (que deve ter prazo de 20 anos) fica com o imóvel. O aluguel deverá ter um limite de comprometimento da renda da família que for contemplada com o imóvel.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a meta é lançar pelo menos 200 projetos do Aproxima até 2022, fim do mandato do presidente. O programa é uma parte do plano maior de reestruturação da política nacional de habitação, que também trará mudanças para o Minha Casa Minha Vida. Os estudos envolvem principalmente os Ministérios de Desenvolvimento Regional e da Economia.

De acordo com integrantes do governo, uma das vantagens do Aproxima é colocar o trabalhador morando em área urbana, próxima do trabalho. Há bastante críticas em relação ao fato de o Minha Casa construir empreendimentos especialmente nas periferias das grandes cidades, principalmente por causa do alto valor dos terrenos.

Outra diferença em relação ao Minha Casa é liberar comércio e prestação de serviços nos condomínios. Isso permite às construtoras e às incorporadoras cobrarem mais caro pelos imóveis comerciais e reduzir as prestações das famílias nos imóveis residenciais. A oferta do terreno pela União também reduz o custo das empresas para construir os empreendimentos.

A limitação no valor da prestação que será pago pelas famílias vai variar de acordo com a região, o perfil do município e a renda dos potenciais moradores. Um dos participantes da formulação do programa deu o exemplo de colocar o teto de 20% da renda para famílias que ganham até três salários mínimos (R$ 2.994).

A empresa que conseguir oferecer a maior quantidade de unidades residenciais tendo como prestação esse valor terá vantagem no processo de licitação. Outro critério que deve ser analisado na concorrência é oferecimento do menor valor de condomínio. O plano do governo é definir que o vencedor do edital mantenha o empreendimento por 20 anos.

Retorno

Segundo o secretário de Desenvolvimento de Infraestrutura, Diogo Mac Cord de Faria, os critérios de escolha do vencedor da concorrência pelo terreno vão considerar o projeto que promova o maior retorno à sociedade. “Eu faço um concurso de ideias de quem consegue me gerar, no fim das contas, um maior retorno para a sociedade, que é a quantidade de famílias de menor poder aquisitivo morando em áreas que jamais poderiam pagar, em locais próximos de seus empregos. Então é bastante inovador, tanto em termos de política pública de habitação quanto em termos de forma de possibilidade desse terreno”, diz.

Estudiosos do setor avaliam que o programa tem potencial de atacar um dos grandes problemas do déficit habitacional no Brasil: o alto valor dos aluguéis. De acordo com pesquisa de 2018 da FGV e da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), o ônus excessivo com o pagamento de aluguel é um dos principais problemas do déficit habitacional enfrentado no Brasil. Esse componente é responsável pela falta de moradia para 42% das 7,8 milhões de famílias que não têm casa própria.

Coordenadora de Projetos da Construção do FGV/Ibre, Ana Castelo entende que, se o governo mantiver a ideia de limitar o aluguel a algo próximo de 20% da renda familiar, o critério poderá fazer frente ao problema. “Em princípio, para uma família que vai pleitear financiamento habitacional, normalmente esse é o valor razoável de uma prestação, de 20% a 30%. Pensando que ela terá custos com a habitação, 20% ainda dá margem para esses custos”.

Pesquisador da Fundação João Pinheiro, Frederico Poley destaca que as cidades têm “carência grande de oferta de imóveis”, e que ações que facilitem a ocupação de terrenos nos centros da cidade são bem-vindas do ponto de vista social. “Governo tem papel importante de facilitar as instalações de mercado, fazendo regulações que sejam efetivas”, diz.

O Aproxima deve ser lançado com a reestruturação da política nacional de habitação, e demandará a edição de uma medida provisória para autorizar que terrenos da União sejam destinados à iniciativa privada, segundo apurou a reportagem. Deve ser também necessário um diálogo com as prefeituras, já que, em alguns casos, os municípios precisarão afrouxar regras do que pode ser construído em determinadas áreas.

Zero subsídio

O Aproxima não deve contar com recursos do Orçamento-Geral da União (OGU), segundo apurou a reportagem, outra diferença em relação ao MCMV. Nos dez anos do programa habitacional criado no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram aportados R$ 110 bilhões em subsídios. Para o ano que vem, o orçamento previsto é de R$ 2,71 bilhões, o menor já colocado no programa em uma década.

s diferenças também são encontradas no modelo de financiamento pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). No Aproxima, a ideia é que o financiamento com recursos do Fundo seja oferecido somente às empresas, com limite de 50% do investimento necessário para construir o empreendimento.

RESOLUÇÃO Nº 4.754, DE 26 DE SETEMBRO DE 2019

Altera a Resolução nº 4.676, de 31 de julho de 2018, que dispõe sobre as condições gerais e os critérios para contratação de financiamento imobiliário pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e disciplina o direcionamento dos recursos captados em depósitos de poupança.

O Banco Central do Brasil, na forma do art. 9º da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, torna público que o Conselho Monetário Nacional, em sessão realizada em 26 de setembro de 2019, com base nos arts. 4º, incisos VI e VIII, da referida Lei, 41 da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, e 95 da Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, resolveu:

Art. 1º A Resolução nº 4.676, de 31 de julho de 2018, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 11. ………………………………………………………………………………….

§ 4º Para fins de apuração do valor do imóvel de que tratam o caput, inciso I, alínea “b”, e o art. 13, inciso I, a instituição proponente pode, alternativamente, empregar modelo de precificação próprio ou de terceiros, desde que:

I – o modelo seja baseado em critérios, premissas e procedimentos consistentes, documentados e passíveis de verificação;

II – o modelo e os sistemas internos de gerenciamento de risco e de monitoramento de garantias da instituição sejam capazes de demonstrar que a análise do risco da operação justifica eventual dispensa de visita de inspeção ao imóvel;

III – os profissionais responsáveis pelos modelos não possuam qualquer vínculo com a área de crédito da instituição ou com outras áreas que possam implicar conflito de interesses ou configurar deficiência na segregação de funções; e

IV – o modelo propicie a geração de relatório individualizado da precificação do imóvel, incluindo o exame dos aspectos relevantes e dos riscos inerentes à estimação do valor do imóvel.” (NR)

Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

ROBERTO DE OLIVEIRA CAMPOS NETO

Presidente do Banco