Copom deve manter plano de voo e cortar Selic em 0,5 ponto

Se, em dezembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central já não mostrou inclinação para acelerar o ritmo de flexibilização dos juros, na reunião desta semana essa disposição deve ser ainda menor. A dinâmica inflacionária voltou a acionar um sinal de alerta entre participantes do mercado, que esperam mudanças pontuais na comunicação do colegiado e acreditam na manutenção de uma postura restritiva da política monetária ao menos até o fim do ano.

Em pesquisa conduzida pelo Valor, com 142 instituições financeiras e consultorias, é consenso a expectativa de que, na quarta-feira, a Selic deve ser reduzida em mais 0,5 ponto percentual e cair para 11,25%. Apenas uma casa — a corretora Planner — projeta um corte mais agressivo, de 0,75 ponto. Já em relação às expectativas para o fim do ano, o ponto médio das projeções indica a taxa em 9%.

Com as festas de fim de ano, a comunicação do Copom foi bastante restrita desde a reunião de dezembro – um fator adicional para a manutenção do plano de voo da autoridade monetária. No campo dos indicadores econômicos, porém, as surpresas observadas ensejaram cautela entre participantes do mercado, especialmente diante de uma leve deterioração na dinâmica dos preços de serviços.

“De dezembro para cá, não vimos nada que alterasse a perspectiva. Claro, houve uma evolução benigna no ambiente internacional do ponto de vista da desinflação e, aqui no Brasil, apesar de a atividade ter mostrado moderação, alguns sinais têm apontado, ainda, para uma resiliência da economia”, diz o economista-chefe para Brasil do BTG Pactual, Claudio Ferraz, que também destaca a pujança do mercado de trabalho e a composição “desfavorável” da inflação.

O IPCA-15 de janeiro, divulgado na sexta-feira, foi o indicador mais recente a desapontar quem esperava uma desinflação mais célere. O indicador, que ficou em 0,31%, veio abaixo do projetado. No entanto, a difusão surpreendeu, ao subir de 55,9% em dezembro para 67%; e a inflação subjacente de serviços, que tem sido alvo de atenção do Copom, saltou de 4,09% para 4,28% ao se considerar a média móvel de três meses anualizada e dessazonalizada.

“Já era um ponto de atenção e os dados, na margem, evidenciam que isso precisa ser observado. O BC já vinha acompanhando esses números e vai continuar. Os componentes da inflação reforçam que o cenário é de manutenção do ritmo e de observação sobre como os preços vão evoluir. Se os sinais de atividade econômica se provarem mais robustos, acho que será um ponto adicional de cautela”, avalia Ferraz.

Leitura semelhante é feita pelo economista-chefe da Western Asset no Brasil, Adauto Lima. Ele nota que o IPCA de dezembro já havia mostrado deterioração na inflação de serviços – cenário que ganhou reforços na sexta-feira. “O processo de reduzir a inflação de serviços é mais difícil e acredito que, também por isso, o BC deve avaliar que a política monetária deve seguir contracionista”, afirma. Lima ressalta, ainda, que as expectativas de inflação de prazos mais longos continuam acima da meta, em 3,5%, no Relatório Focus.

Essa desancoragem ganha destaque particular no momento em que o horizonte relevante do Copom deve incluir o ano-calendário de 2024 e, em grau maior, o de 2025. Assim, a inflação esperada para o próximo ano já deve começar a ter mais importância na condução da política monetária.

Na pesquisa conduzida pelo Valor, de um total de 135 casas, a mediana aponta para o IPCA em 3,5% no próximo ano. Apenas dez casas veem a inflação no centro da meta em 2025 – casos de UBS BB e Opportunity, por exemplo. Há, contudo, instituições que projetam uma inflação no teto da meta (4,5%) ou até acima, como a gestora Apex Capital e a Genial Investimentos.

O economista-chefe da Bradesco Asset Management, Marcelo Toledo, espera poucas mudanças no comunicado e acredita que a indicação de cortes de 0,5 ponto na Selic nas próximas reuniões, no plural, deve permanecer.

“A inflação tem mostrado um cenário benigno para os núcleos e, olhando para médias dos últimos três meses, estamos em torno dos 3%, apesar da volatilidade das leituras mensais. O outro motivo é o nível da taxa de juros, já que 11,75% ainda está em território bastante contracionista. Se o BC cortar 0,5 ponto e sinalizar mais 1 ponto de cortes, ainda estaríamos falando de 10,25% em maio, o que é bastante restritivo”, diz Toledo. “Não vemos o Copom ter grandes dúvidas sobre o espaço para chegar a 10,25% de juro e, portanto, essa sinalização deve ser mantida.”

Apesar da postura relativamente confortável do Copom, Toledo avalia que, em algum ponto do ciclo, a indicação de “duas reuniões à frente” precisará ser discutida e o assunto pode acabar aparecendo na ata. “Eventualmente podemos ver algum debate, revelado pela ata, sobre o BC discutindo se essa comunicação não deveria mudar, porque, em algum momento, essa sinalização vai ter que mudar. A questão é como o Copom vai sinalizar a retirada do ‘guidance’ [projeção] sem que isso signifique uma alteração do plano de voo”, diz.

Valor Econômico

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