Programa de habitação revê faixas e anima o mercado

Aumento das faixas de renda permitirá que mais pessoas financiem compra de imóvel
Aumento das faixas de renda permitirá que mais pessoas financiem compra de imóvel Foto: Getty Images

Afetado pelo aumento do custo da construção civil e pela perda do poder de compra dos consumidores por conta da inflação, o mercado imobiliário tem visto com bons olhos a série de mudanças no programa Casa Verde e Amarela nos últimos meses. A mais recente aconteceu no início de setembro, quando a Caixa anunciou a ampliação do prazo de financiamento de 30 para 35 anos.

Segundo o banco, o novo prazo permite que famílias com renda de até R$ 8 mil diluam, ao longo do tempo, as parcelas do imóvel que tiveram o valor reduzido de 5% a 7,5%. A decisão aconteceu depois de o Conselho Curador do FGTS ampliar, em julho, a faixa de renda familiar e baixar as taxas de juros. O limite de renda para o grupo 2 passou de R$ 4 mil para R$ 4,4 mil e houve aumento de subsídio. O grupo 3 passou de R$ 7 mil para R$ 8 mil. Em março deste ano, o grupo 1 já havia sido reajustado de R$ 2 mil para R$ 2,4 mil.

Para o presidente da Ademi-RJ, Marcos Saceanu, a elevação das faixas de renda do programa habitacional e do prazo de financiamento deve ajudar as construtoras, pois permitirá que mais pessoas tenham capacidade financeira para comprar um imóvel. Embora as medidas da Caixa sejam um alento para o mercado, Saceanu diz que o desafio de viabilizar empreendimentos populares continua, em função do alto custo dos insumos utilizados na construção civil.

Segundo ele, a retrospectiva dos últimos anos mostra queda significativa no número desses empreendimentos. Até 2021, eles representavam mais da metade do que era construído no Brasil, agora correspondem apenas por cerca de 30% do total.

— Essa redução foi provocada pela alta nos custos da construção, o que levou muitos projetos a ficarem de fora do programa habitacional do governo nos últimos 12 meses. Falta viabilidade financeira para esses projetos, já que há um teto de preço para venda das unidades enquadradas no programa — explica.

Saceanu diz que a recuperação da capacidade das construtoras de viabilizar esse tipo de empreendimento é fundamental, pois o déficit habitacional para a faixa de renda abarcada pelo programa é gigantesca.

— As construtoras associadas informam que vendem tudo que é lançado. O que falta são produtos para essa demanda. A solução passa por um conjunto de fatores, como a construção de empreendimentos que caibam no bolso das famílias por meio de financiamentos — completa.

O presidente do Sinduscon-Rio, Claudio Hermolin, afirma que as novas faixas vão permitir que mais compradores se encaixem no programa, o que vai se refletir em mais lançamentos no segmento econômico. Para ele, isso vai ajudar a compensar a queda histórica no número de lançamentos nos últimos anos.

— O número de unidades do segmento popular construídas desde 2009, quando o programa foi lançado, nunca foi inferior a 50% do volume total. Essa redução drástica é inédita, o que é um contrassenso, pois o país tem um dos maiores déficits habitacionais do mundo — argumenta Hermolin.

O gerente geral da Vivaz, Alain Deveza, reforça que o momento é desafiador para o mercado de construção, que não tem como repassar o aumento de custos para o consumidor.

— Um item relevante é o teto de preço das unidades que se enquadram no programa. Isso tem uma importância natural para nós, justamente por ser um dos critérios que definem se um empreendimento realmente pode ficar de pé ou não.

Mudanças garantem velocidade às vendas

Construtoras têm conseguido comercializar os imóveis e manter margem de lucros

Negócios em bom ritmo mantêm fluxo de lançamentos
Negócios em bom ritmo mantêm fluxo de lançamentos Foto: Getty Images

 O momento é de desafios no setor imobiliário, mas algumas construtoras não têm reclamado do desempenho de vendas de suas unidades enquadradas no programa habitacional. O diretor de Relação com Investidores e Relações Institucionais da Cury, Ronaldo Cury, afirma que a demanda por imóveis nesse segmento é resiliente.

— As mudanças promovidas pela Caixa nos permitem manter a velocidade de vendas em patamares altos, o que é muito saudável para nossa operação. A Cury vem conseguindo preservar suas margens, principalmente por atuar nas faixas mais altas do programa em locais centrais de São Paulo e do Rio de Janeiro — destaca.

Na opinião dele, uma mudança significativa e mais atrativa para o programa seria o aumento de subsídio para as faixas de renda mais baixas. Mas ressalta que, para isso, seria preciso liberar verba do Orçamento Geral da União, pois apenas os recursos do FGTS, usados para subsidiar o programa, não seriam suficientes. Já o diretor Comercial e de Incorporação da Direcional Engenharia, Adriano Nobre, destaca que a construtora vem registrando boas vendas, tanto que o fluxo de lançamentos no Rio continua inalterado.

— Com a mudança no regime de financiamento promovida pela Caixa, acreditamos que a velocidade de vendas permaneça consistente no estado.

Extra

Juiz condena empresa do setor de construção por uso indevido de marca

A proteção de marcas não tem apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais do seu titular, mas objetiva, acima de tudo, proteger os compradores de produtos ou serviços.

Esse foi o entendimento do juiz Alexandre Lazzarini, da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, para dar provimento a recurso de uma empresa contra decisão que julgou improcedente ação ajuizada contra uma empresa concorrente. 

No caso concreto, uma empresa do ramo de materiais de construção civil acionou uma concorrente por uso indevido da marca. A autora comprovou o registro das marcas “Pires Atacado e Varejo Materiais para Construção” e “Pires Materiais de Construção” junto ao INPI.

Em sua defesa, a empresa concorrente afirmou que o uso da marca teria de dado de forma consensual pelos sócios proprietários originais da autora e que teriam convivido amigavelmente até 2012 quando tiveram desentendimentos familiares.

O juízo de piso julgou improcedente a ação. Ao analisar o recurso, o magistrado entendeu que a decisão questionada deveria ser revogada já que ainda que houvesse uma anuência tácita da autora acerca da utilização de sua marca pela ré, inclusive do logotipo, após o ano de 2012 essa anuência deixou de existir. 

“Configurada, portanto, a prática do ato ilícito em razão da prática de concorrência desleal, faz jus a autora à indenização por danos materiais, a ser apurada em fase de liquidação, nos termos do art. 210 da Lei n. 9.279/96, acrescido de correção monetária pelos índices da Tabela Práticado TJ-SP”, registrou o magistrado. A empresa autora da ação foi representada pelo advogado Henrique Somadossi Prado, do escritório Maia Sociedade de Advogados.

Consultor Jurídico

Busca por mais qualidade de vida em casa faz venda de imóveis na Barra crescer 90% na pandemia

A falta do vaivém de pessoas devido à pandemia foi sinônimo de baque econômico para muitos setores, como o de turismo. No entanto, foi o mesmo motivo — o fato de a sociedade estar mais voltada para o ambiente de casa, mesmo após o afrouxamento das medidas de isolamento — que aqueceu o mercado imobiliário durante o período, apontam especialistas. Um levantamento do 15º Ofício de Notas, localizado no Shopping Downtown, mostra uma disparada na compra e venda de imóveis na Barra e em bairros vizinhos.

O número de escrituras do tipo registradas no cartório passou de 1.707, em 2020, para 3.292, em 2021, um aumento de 92,9%. Apenas no primeiro semestre de 2022, 1.701 documentos foram assinados, 8,3% a mais que em todo o ano de 2019, quando foram feitos 1.572 registros de compra e venda no local.

Áreas de lazer como esta do condomínio Reserva Mirataia II, em Jacarepaguá, são uma das prioridades dos compradores
Áreas de lazer como esta do condomínio Reserva Mirataia II, em Jacarepaguá, são uma das prioridades dos compradores Divulgação/ Patrimar

— O nosso ordenamento jurídico diz que para uma transferência de imóvel no valor acima de 30 salários mínimos deve-se fazer escritura pública. No processo de registro, o tabelião faz a análise jurídica da propriedade e do vendedor, para verificar se estão em situação legal ou se existe alguma pendência, como uma ação contra o proprietário. Se estiver tudo certo, lavramos a escritura, que garante maior segurança jurídica ao comprador — explica Fernanda Leitão, tabeliã do 15º Ofício de Notas.

Dados do Secovi Rio, o Sindicato de Habitação do estado, confirmam o melhor desempenho do setor imobiliário nos dois primeiros anos de pandemia em relação ao período anterior. De acordo com a instituição, 4.406 imóveis foram vendidos em 2021 na Barra da Tijuca, 37,7% a mais que em 2020, quando o número chegou a 3.200. Em 2019, a cifra ficou em 2.937.

— A Barra é muito heterogênea em termos de moradia, com apartamentos de diversos tamanhos, em condomínios com segurança e infraestrutura para criar os filhos e garantir o lazer em família. Isso combinou muito bem com o momento de pandemia, em que as pessoas começaram a buscar mais qualidade de vida e um espaço maior dentro de casa, até por conta do trabalho no formato home office ou híbrido. Isso, somado a uma taxa de juros mais atraente em 2021, aumentou a quantidade de imóveis negociados na região — avalia Leonardo Schneider, vice-presidente do Secovi.

Moradores miram lazer e bem-estar

Após cinco anos morando no Pechincha, a consultora de vendas Karine Kremer, de 40 anos, vendeu seu apartamento no primeiro semestre do ano passado e comprou outro no empreendimento Verano, no Rio 2, em busca de uma área de lazer para seu filho dentro do condomínio. Ela conta que Bernardo Kremer, de 10 anos, estava dependente de celular e videogame, por falta de alternativa de distração em meio à crise sanitária.

— Passávamos muito tempo dentro de casa. Depois que as medidas de isolamento relaxaram, queria que meu filho pudesse descer e ter onde brincar. Mas, sem essa oportunidade, ele ficava o tempo inteiro nos eletrônicos, o que acabou o deixando mais ansioso — relata a mãe.

Diretor comercial e de marketing do Grupo Patrimar, que tem empreendimentos imobiliários na região, Lucas Couto afirma que o desejo por ambientes que favoreçam o bem-estar dos moradores é o da maioria dos compradores:

— De forma geral, as pessoas, da baixa à alta renda, procuram mais liberdade desde dentro do apartamento até a área comum do prédio. Prezam ambientes mais iluminados e mais abertos, com varandas e janelas maiores, por exemplo, além de uma infraestrutura de lazer completa, para desfrutarem disso com comodidade no dia a dia.

A construtora Novolar, segmento de baixa e média rendas do grupo, com empreendimentos lançados em Jacarepaguá, Recreio e Vargem Grande, beneficiou-se do bom momento do setor. Em 2021, vendeu 51,4% dos apartamentos ofertados (828 de 1.612); em 2020, o percentual havia sido de 27,8% (231 de 832).

Já a Patrimar, que chegou ao Rio em outubro do ano passado com empreendimentos de luxo, vendeu 48% (118 de 246) das unidades do Oceana Golf, localizado na Barra e o primeiro a ser lançado pelo grupo mineiro na cidade.

— Dentro da nossa ótica, a Barra da Tijuca como um todo é o desejo do carioca, porque é um bairro quase todo litorâneo, com muitas opções de comércio, incluindo diversos shoppings e supermercados. Então, é um bairro completo, o que acaba atraindo as pessoas. Com a pandemia, esse movimento natural que já acontecia foi potencializado, devido à valorização dos lares e do bem-estar. E a Barra, por ter um grande volume de empreendimentos lançados em áreas maiores, se comparados à Zona Sul, atende melhor o comprador nesse quesito — explica Couto.

O Globo