A metamorfose ambulante do empreendedor e da empresa

O que um Optimist, uma lancha de 36 pés e um transatlântico têm em comum? A resposta é fácil, as três são embarcações. Porém, isso não significa que uma mesma pessoa seja capaz de dirigir, com a devida competência, os três barcos. Muito pelo contrário, tanto os hard skills quanto os soft skills necessários para isso são diferentes.

O exemplo dos barcos é para mostrar que algo semelhante acontece com as empresas. Uma startup enfrenta diferentes desafios ao longo de sua trajetória e os skills (habilidades) necessários ao empreendedor vão mudando ao longo do tempo. Por isso, muitas vezes o empreendedor que leva a startup até um determinado estágio não é a melhor pessoa para seguir dali em diante.

Num primeiro momento, há o desafio de se tirar uma ideia do papel e construir um business do zero. O produto não existe, precisa ser criado. O empreendedor precisa ter criatividade, ser capaz de resolver problemas com rapidez, precisa ser objetivo, ter uma escuta ativa, ser flexível.

Neste estágio, a velocidade é muito importante. O produto precisa ser colocado a prova rapidamente e cada nova funcionalidade precisa ser rapidamente testada, para que a startup otimize os escassos recursos que possui. A resiliência é fundamental porque muita coisa não sai como o previsto; aliás normalmente há mais dias tensos do que felizes nessa fase. A incerteza paira no ar e o empreendedor precisa acreditar o tempo todo em sua visão, para seguir em frente.

Num segundo estágio, quando a startup já tem o seu produto validado no mercado, o desafio passa a ser escalar a operação. Neste momento, ela já costuma ter uma equipe e as funções internas começam a ser segregadas. O empreendedor aqui começa a ter que delegar responsabilidades e aí ele precisa saber como fazer isso, como motivar o time, como controlar o desempenho das pessoas e das áreas. Precisa saber identificar as capacidades de cada colaborador, o que motiva cada um, o que ele faz bem e o que não é sua habilidade. Precisa ter uma visão integrada da operação, saber estruturar processos, conseguir antever possíveis gargalos e saber como evitá-los.

Ao cruzar este segundo estágio, vem a fase da consolidação e de um crescimento mais sustentado. Aqui o empreendedor precisa ter disciplina, capacidade de comunicação, de persuasão, de negociação, de liderança, de aprendizado, de coordenação de múltiplos times, conseguir se adaptar facilmente. Neste momento da empresa, os skills são parecidos com os de um executivo numa grande empresa. E o autoconhecimento vai ser fundamental para que o empreendedor avalie se ele é a melhor pessoa para tocar o negócio dali para frente.

Analisando dessa forma, parece que esses estágios são facilmente identificáveis, porém na prática não é o que acontece. Não há indicadores numéricos que digam em qual fase a empresa está. E isso costuma complicar as coisas, porque o empreendedor muitas vezes só percebe que lhe faltam os skills necessários quando já é tarde demais.

Por isso é importante o empreendedor ter humildade para constantemente olhar para isso. Esse é um exercício que ele deve praticar todos os dias: identificar os desafios de sua empresa e como ele está preparado, enquanto líder, para endereçá-los. Capacitar-se o tempo todo é necessário, mas nem sempre será suficiente.

Valor Investe, por Guilherme Horn, empreendedor serial, fundador de 6 startups, entre elas a Ágora e a Órama

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