Em meio à escalada dos juros no Brasil e o alto endividamento das famílias, um grupo formado por ativistas e integrantes de movimentos sociais lança, hoje (16), o manifesto ‘Basta de abuso’ contra o alto custo dos financiamentos no Brasil, que aponta como agravante das dificuldades financeiras dos mais pobres.
Uma petição on-line recolherá assinaturas para propor que sejam estabelecidos em lei limites para os juros cobrados pelos bancos em serviços como os de cartão de crédito, cheque especial, empréstimo pessoal e outros financiamentos.
O objetivo, segundo os organizadores da iniciativa, é viabilizar, a partir do abaixo-assinado, um projeto de lei de iniciativa popular que estabeleça limites para a aplicação de juros bancários no país, numa iniciativa similar à que instiuiu a exigência de ficha limpa para candidatos em eleições, em 2010.
Isso, porque não há na legislação brasileira um limite para os juros praticados em determinados serviços financeiros, o que tornam as instituições bancárias livres para definirem as taxas que cobrarão dos clientes de acordo com as condições do mercado.
O custo do crédito acaba definido de acordo com competição no mercado bancário, historicamente concentrado no Brasil, mas que nos últimos anos tem ampliado a concorrência com a chegada das fintechs, como são chamadas as start-ups financeiras.
Levantamento feito por economistas, juristas e ativistas sociais que atuam como apoiadores da iniciativa para embasar o manifesto aponta o que classificam como evidências de práticas de juros abusivos no Brasil, com taxas que podem chegar a 1.200% ao ano em algumas modalidades de crédito.
Juros superam muito a taxa básica do país
Segundo dados do Banco Central, o juro médio total cobrado pelos bancos no Brasil, em fevereiro de 2022, foi de 355,2% ao ano. A taxa básica de juros (Selic), estabelecida pelo Banco Central, é atualmente de 12,75% ao ano, a maior do mundo.
Um levantamento feito pelo economista e diretor de pós-graduação do UniAnchieta, Filipe Pires, com base em dados do BC mostra que a taxa média de juros cobrada pelo rotativo do cartão de crédito subiu de 327,04% ao ano em fevereiro de 2021, quando a Selic estava no patamar de 2%, para 355,19% em fevereiro de 2022, quando o juro básico era de 10,75%.
Nesse mesmo período, a taxa do cheque especial foi de 125,52% ao ano para 132,6%. O efeito contrário ocorreu, no entanto, com crédito pessoal não consignado, cujo custo caiu de 84,45% para 83,42% ao ano.
Para chegar ao Congresso, é necessário 1,6 milhão de assinaturas
O grupo que organiza o abaixo-assinado argumenta que os juros no Brasil são muito mais altos que os da maioria dos países, onde não passam de dois dígitos. Para tentar mudar esse cenário, o grupo espera recolher cerca de 1,6 milhão de assinaturas — o equivalente a 1% dos eleitores brasileiros, mínimo exigido para a tramitação de um projeto de iniciativa popular no Congresso Nacional — para protocolar a proposta na Câmara dos Deputados.
Um dos apoiadores do movimento é o engenheiro, economista e empresário Eduardo Moreira, palestrante e autor de livros sobre finanças. Ele diz que o que considera cobrança abusiva de juros bancários é um problema antigo no Brasil, mas agravado na atual conjuntura macroeconômica, marcada por desemprego, inflação e juros básicos altos.
Moreira argumenta que esse contexto torna ainda mais urgente a discussão sobre o tema:
— A gente tem essa condição histórica, mas chegamos ao pior momento da história. A renda diminuiu e o desemprego aumentou enquanto a taxa (básica) de juros (Selic) foi de 2% pra 12,75%. É o maior aumento de juros no mundo, só perde para o da Rússia, que está no meio de uma guerra. Além disso, 77% das famílias brasileiras atrasaram contas e dívidas em abril, número recorde da série histórica. E 30% delas afirmam que não têm recursos para pagar.
A expectativa do grupo é, além de mobilizar cidadãos e sensibilizar parlamentares, convocar outras organizações e movimentos sociais para ampliar o engajamento à causa.
Para apoiar a iniciativa, basta acessar o site http://movimentobastadeabuso.org/ ou assinar a petição diretamente no link da plataforma change.org.
O Globo