Robô já conduz venda de imóveis na capital paulista

O anúncio da venda de um apartamento em São Paulo feito com a ajuda de uma assistente virtual surpreendeu o mercado imobiliário no início deste mês. Não por acaso! Era a primeira vez que um “robô” conduzia a negociação inicial com o cliente, compreendendo suas necessidades e indicando produtos com base na inteligência artificial (IA). Um fenômeno que, tudo indica, deve se intensificar nos próximos anos.

Pesquisa realizada pela Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e pela Brain Inteligência Estratégica, com a participação de 163 executivos do setor, constatou que 19% deles já utilizam algum recurso tecnológico apoiado em IA em suas companhias.

O estudo constatou ainda que 27% das empresas consultadas já têm áreas especializadas em IA e que 83% veem positivamente o impacto desse tipo de ferramenta nos negócios. O relatório demonstrou também que 21% dos entrevistados entendem que a área de atendimento ao cliente é a que mais pode se beneficiar da inteligência artificial.

O “case” citado é da Tecnisa, que criou a Isa, assistente virtual personalizada em uma figura feminina, disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, capaz de responder a perguntas em pelo menos quatro idiomas.

Para negociar o imóvel — um apartamento no bairro Nova Klabin, na Zona Sul da capital paulista —, Isa precisou de apenas 35 minutos. Definido o produto, o robô direcionou o atendimento à área de vendas para os trâmites finais.

Segundo a companhia, Isa pode compartilhar e-books, fotos dos ambientes, informações técnicas sobre os empreendimentos e fazer tour virtual. Ela também compreende áudios e nuances linguísticas, e toda a interação acontece no ambiente de conversa do WhatsApp. O objetivo da Tecnisa é agilizar e aprimorar o processo de pesquisa e compra de seus imóveis.

Com o mesmo propósito, a Trisul lançou em julho a Mila, sua corretora digital. Também alimentada por IA, a assistente tem como missão dar celeridade aos atendimentos e obter o máximo de conhecimento sobre a demanda do cliente, a fim de entregar um “lead” mais qualificado para o departamento de vendas. “O principal ganho da Mila para a área comercial é a pré- filtragem de informações que ela faz. Assim, o corretor pode investir tempo e esforço somente com os interessados mais maduros, o que aumenta o nível de assertividade”, comenta Cassius Cunha, gerente de Marketing Digital da Trisul.

Segundo ele, cerca de 250 atendimentos mensais passam pela assistente virtual. “E a ideia é ganhar escala e aumentar esse tráfego”, diz Cunha.

O crescimento na aplicação de IA não preocupa Cunha quanto ao espaço do corretor de imóveis no futuro. Para ele, na fase final de concretização da venda, o fator humano continuará sendo imprescindível. “A compra de um imóvel é a realização de uma vida. E eu acho muito frio fazer isso 100% no digital. O contato físico e o olho no olho ainda serão fundamentais.

PÓS-VENDA

Para especialistas, o papel da IA no mercado imobiliário pode ir muito além do atendimento ao cliente. A administração de contratos, a precificação dos imóveis e a segurança relacionada à corretagem podem ser aprimoradas com inteligência artificial.

O “core business” da Growth Tech é o desenvolvimento de “smart contracts” para o setor: contratos autoexecutáveis com dados registrados no blockchain, que garantem mais eficiência ao gerenciamento da jornada pós-venda. Agora, a empresa investe na mineração de dados gerados por esses contratos para criar análises preditivas que possam retroalimentar o próprio mercado.

“Com o auxílio da inteligência artificial, conseguimos detectar certos padrões de consumo e tendências de comportamento do cliente. Assim, é possível enxergar aquele que tem interesse em outro imóvel ou oferecer serviços complementares que melhorem a experiência de uso do imóvel, desde dicas de restaurantes a lavanderias mais próximas”, afirma Hugo Pierre, CEO da Growth Tech.

Já a startup Loft usa inteligência artificial para precificar com mais exatidão os imóveis que estão em sua plataforma. “A definição do valor, em geral, vem de conversas com zeladores, moradores e amigos, em um processo muito sujeito a erro. Não é à toa que um imóvel no Brasil leva, em média, 16 meses para ser negociado, enquanto nos Estados Unidos as vendas ocorrem em três ou quatro meses”, argumenta Luis Bitencourt-Emilio, CTO da empresa.

“Nossa ferramenta é treinada com informações de mais de dez milhões de anúncios e o histórico dos preços transacionados. São informações poderosas para que o corretor consiga convencer o dono do imóvel a ajustar o preço caso esteja acima do praticado pelo mercado”, explica.

Os outros usos de IA dentro da empresa referem-se à produção de anúncios e ao rastreamento da venda de imóveis cuja jornada fora iniciada na plataforma, mas finalizada por fora sem pagamento da comissão. Com esse sistema, segundo o executivo, foram recuperados cerca de R$ 350 mil em taxas de corretagem não pagas.

Bitencourt-Emilio se diz empolgado com a revolução em curso promovida pela IA. “Ainda há muito por vir, sobretudo pelo fato de a inteligência artificial generativa já ter cruzado o abismo da curva de adoção de tecnologia e estar presente no cotidiano de todos nós, o que vai possibilitar seu uso imediato em grande escala”, conclui.

Valor Econômico, caderno Imóveis de Valor

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