A revolução dos tokens está apenas começando

Ninguém se arrisca mais a dizer com algum grau de certeza como será o futuro do dinheiro. Mas especialistas de diversas áreas, de criptomoedas a bancos digitais, parecem concordar em dois pontos: o mundo financeiro já está em transformação e será muito diferente nos próximos anos. Em um período de cinco a dez anos, o dinheiro pode mudar de forma abrupta, as fronteiras monetárias ficarão mais tênues ou entrelaçadas, a variedade de moedas vai se multiplicar, cada vez mais as trocas de valor serão instantâneas e até mesmo cidades virtuais ou “meta países” corporativos poderão abrigar unidades próprias de pagamento.

Nesse novo universo, tecnologias como DeFi, NFT, criptomoedas, stablecoins, CBDCs, metaverso e blockchain ditam as regras do jogo financeiro. Na visão do autor do livro “O Futuro do Dinheiro” e cofundador da fintech Arthur Mining, Rudá Pellini, “o dinheiro pode se tornar um livre mercado onde vence o melhor”. Conforme o especialista, “caminhamos para isso, ou seja, ter diferentes tipos de moedas virtuais no mundo, como as emitidas por corporações”.

O especialista lembra que a própria Meta, controladora do Facebook, no passado recente anunciou a criação de uma moeda virtual para ser usada em seu ecossistema de redes sociais. Batizada inicialmente de Libra e renomeada no fim de 2020 para Diem, o projeto ainda continua só no papel. A iniciativa enfrenta resistências de vários bancos centrais no mundo pelo potencial de fomentar um sistema monetário paralelo, com alcance global, e sem controle das autoridades.

“Em algum momento, o Diem deve ser lançado”, avalia Pellini. “O próprio metaverso vai colocar a [ideia da] moeda do Facebook de volta, porque será ali onde vai funcionar. Ou seja, a Meta criou um mundo paralelo para ter sua moeda própria.”

A ideia de metaverso, na visão de especialistas, é mais antiga do que a recente atenção dada ao tema, quando o Facebook mudou sua denominação. “Para muitos jovens parece um negócio novo e moderno, mas há 20 anos houve [a tentativa] de criação de um mundo virtual, o ‘Second Life’, que depois desapareceu”, lembra a coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV/Eaesp, Claudia Yoshinaga.

Para a pesquisadora, a ideia de metaverso, ou seja, uma realidade virtual onde as pessoas podem “viver” uma vida virtual, com troca de experiências, serviços e consumo, só se torna viável com uma moeda própria no ecossistema. “Essa ideia de se comprar moedas de empresas como forma de colocar crédito para consumir produtos e serviços ou negociar ‘ativos’ nas plataformas têm se somado ao conceito de metaverso e sido mais difundida.”

O diretor da ABCripto, Bernardo Srur, ressalta que a ideia de metaverso, na verdade, não exclui o mundo físico. “De certa forma a gente já vive em um metaverso, fazemos reuniões virtuais, por exemplo, como se fosse um encontro presencial. Metaverso é o encontro do mundo físico com o digital e não necessariamente um universo virtual.”

Conforme o diretor de autoatendimento da Tecban, Luiz Stefani, “até bancos digitais ou empresas 100% on-line, começam a querer se estabelecer no mundo físico para garantir uma experiência completa aos clientes”.

Srur, da ABCripto, cita experiências de marcas como Nike e Adidas com uso de “non-fungible token” (NFT), um protocolo usado para criar ativos digitais, ou seja, representações de objetos e contratos do mundo real. “As marcas vendem, por exemplo, um NFT em um jogo on-line, esse ativo pode ser apenas um tênis no metaverso, ou seja, ser levado para outras plataformas, mas também um produto no mundo real. Com o NFT, o proprietário pode entrar numa loja e sair com o calçado físico. É uma intercambialidade entre mundos.”

Para além dos universos virtuais, o impacto das tecnologias sobre as finanças promete também transformar o mundo real. “Uma globalização ampla [dos sistemas financeiros] pode surgir na esteira das novas tecnologias”, afirma Yoshinaga, da FGV. A especialista explica que uma das iniciativas que têm sido aceleradas nos últimos anos, as “central bank digital currency” (CBDC), ou seja, as moedas digitais emitidas por bancos centrais, “pode tornar os BCs cada vez mais integrados”.

Segundo o diretor de digital cash management e open finance do Itaú Unibanco, Marcos Cavagnoli, “90% dos BCs [no mundo] estão avaliando alguma pauta de CBDC”. O executivo pondera que “em uma janela até 2025 ou 2026 vamos ter no Brasil um open finance e um pix bem amadurecidos, além de um projeto de CBDC [de um real digital] recém-lançado”.

A junção dessas tecnologias vai criar um ambiente muito mais flexível, rápido e eficiente em termos de transações financeiras tanto dentro do país quanto para fora. “Nas operações transfronteiriças, o real digital pode trazer benefícios de velocidade, custo unitário e rastreabilidade”, conclui.

Valor Econômico

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