Governo estuda adotar voucher para educação, saúde e moradia

Ao participar do Fórum Econômico Mundial em Davos, na semana passada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, declarou que pode adotar a distribuição de vouchers para a educação na primeira infância (entre 0 e 5 anos). A política pública distribui vales para que o cidadão possa escolher no setor privado escolas, hospitais ou a própria casa própria em vez de usar serviços públicos. Não é a primeira vez que um membro do governo Bolsonaro cita esse tipo de política. A justificativa é que a prática aumenta a competição, melhorando o serviço. Avaliações de especialistas de diversas áreas sobre experiências internacionais similares mostram resultados ambíguos, não sendo líquido e certo que a política trará os resultados esperados, além de ser um tipo de programa usado em baixa escala.

DESIGUALDADE NO CHILE

Pesquisadores alertam que a prática precisa ser cercada de regulação forte, monitoramento constante e certificação para alcançar os objetivos desejados. Sem isso, pode reeditar os problemas que houve no Chile, o primeiro a usar o voucher na educação, o que fez aumentar a desigualdade. 

Para o superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, economista com longa experiência em gestão pública na educação, programas para a primeira infância precisam ser integrados a políticas de saúde e assistência social, o que fica difícil quando o governo dá vales às famílias. Marcelo Neri, diretor do FGV Social, avalia que o sistema pode ser usado na primeira infância, principalmente porque no Brasil não há oferta de creches públicas para atender toda a demanda. Atualmente, somente 37% das crianças de 0 a 3 anos estão em unidades do governo ou privadas. 

— Investir na primeira infância tem altos retornos, e o voucher poderia tornar essa escolha da creche mais eficiente. Mas essas coisas precisam ser testadas. Tem de avaliar. Não é só porque a teoria econômica diz que funciona que vai se aplicar. Tem de saber em quais condições funciona. Seria adequado fazer um piloto, aprender. Esse mecanismo não é uma coisa muito brasileira — afirma Neri. 

Na saúde, outra área em que se chegou a cogitar vouchers, os especialistas tendem a rejeitar a medida. Segundo a sanitarista Ligia Bahia, do Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da UFRJ, onde o voucher foi adotado, o objetivo era aumentar a demanda, fazer as pessoas usarem o serviço de saúde para prevenir doenças. Ela citou como exemplo países da África e Ásia, onde se distribuem vales para comprar mosquiteiros com inseticida. Mas não é o caso do Brasil, diz, onde o problema é falta de recursos para melhorar o sistema público.

Como política habitacional, o uso do voucher também é questionável. Para Ana Maria Castelo, do setor de construção da Fundação Getulio Vargas, distribuir voucher pode ser uma volta ao passado, quando se estimulava a autoconstrução. Além disso, pode levar a aumento de preços com a criação de demanda antes de ter a oferta para atender ao beneficiário do sistema.

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