Copom se mostra confortável com taxa de juros em 2% mesmo com risco fiscal e inflação no radar

A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa Selic em 2% ao ano surpreendeu um total de zero pessoas no mercado financeiro e, assim, toda a atenção se voltou para o comunicado. Embora o texto do Copom que justifica a decisão tenha dado destaque ao risco fiscal do cenário atual e à aceleração da inflação, o “recado” principal segue na postura “dovish” do Banco Central, ou seja, favorável a taxas mais baixas de juros e menor preocupação com a inflação.

“O mercado estava ansioso para entender como o Banco Central irá se comportar frente a alta recente da inflação e ao seu balanço de riscos”, conta Alexandre Espirito Santo, economista-chefe da Órama.

Para Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, esse tom mais propenso aos juros baixos fica evidente no trecho do documento em que o Copom diz que as condições para o “forward guidance”, ou seja, prescrição das decisões futuras, “seguem satisfeitas”.

“O comitê mostrou que a situação econômica e fiscal do Brasil segue da mesma forma que da reunião anterior, sem novidades, e que a inflação está sobre controle, dentro da faixa da meta, então ele se sente confortável para manter o juros nesse patamar”, avalia Paloma Brum, economista da Toro Investimentos.

No texto, os membros do Banco Central destacaram o fato de que os indicadores mais recentes de inflação ficaram acima do esperado e, por isso, elevou sua projeção para os últimos meses de 2020. Contudo, a avaliação é de que esse choque de preços no bolso dos brasileiros é “temporário”.

“Ao contrario da nossa avaliação, que era de que o Copom teria um comunicado um pouco mais ‘duro’, não foi isso o que aconteceu, do nosso ponto de vista. Na verdade, o comunicado veio perfeitamente dentro do estilo do comunicado anterior, com pequenas diferenças”, afirma José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.

Guilherme Attuy, economista-chefe da Gauss Capital, destaca que mesmo que o Banco Central tenha deixado subentendido que a taxa de juros em 2% é compatível com a convergência da inflação à meta, a autoridade monetária não fechou totalmente a porta para cortes futuros.

Mas que tipo de situação justificaria mais cortes? Para Paloma Brum, se a segunda onda de covid-19 ganhar mais força, atrasando o processo de recuperação da economia global, pode prejudicar o crescimento de diversas economias, especialmente de um país emergente como o Brasil.

“O Banco Central estaria deixando uma margem para fazer um novo corte caso seja necessário, ou seja, caso essa segunda onda se intensifique e venha a prejudicar o desempenho da recuperação econômica”, explica Brum.

Roberto Indech, estrategista-chefe da Clear Corretora, destaca o trecho do comunicado em que o Copom fala sobre o prolongamento das políticas fiscais – com o auxílio emergencial – em resposta a pandemia, que teria piorado a trajetória fiscal do país e que, se não houver continuidade das reformas, pode haver aumento nos prêmios de risco.

Com recados mais “suaves” do que o mercado esperava sobre os riscos fiscais e a inflação, o pregão amanhã deve mostrar investidores reavaliando o pessimismo repercutido nos últimos dias em torno da inflação. Segundo João Rosal, economista-chefe da Guide Investimentos, o movimento “foi exagerado e isso vai ter implicação só para a parte curta, principalmente, da curva de juros”.

Do outro lado, Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Investimentos, avalia que o comunicado sinalizou pouca coisa. “O que o Banco Central está fazendo é mostrar para a gente que está difícil prever o cenário”, diz.

De qualquer forma, a maior parte do mercado acredita que Selic só deve passar por alguma alteração – provavelmente para cima – no próximo ano. “A próxima reunião do Copom acontecerá no apagar das luzes de dezembro, então provavelmente só teremos mudança na taxa no ano que vem, quando o próprio relatório Focus do Banco Central indica uma taxa ao redor de 2,75% em dezembro de 2021”, afirma João Manuel Campanelli, diretor de operações do Travelex Bank.

Valor Investe

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